Quando a resolução do contrato se der por inadimplência do adquirente, também deverá haver a devolução dos valores pagos.
Por Ana Letícia Dias Rosa – Coordenadora do Grupo de Direito Imobiliário
A Lei 13.786/2018, que acaba de entrar em vigor, regulamenta o distrato imobiliário e trata dos direitos e deveres nos contratos relativos a imóveis em empreendimentos imobiliários, devendo prevenir litígios sobre questões relativas ao inadimplemento e às penalidades aplicáveis.
A questão relativa à comissão de corretagem foi fonte de inúmeras demandas judiciais, até ser pacificada, pelo STJ, em julgamento de recursos repetitivos, em agosto de 2016. Naquela ocasião, reconheceu-se a validade da previsão estabelecendo a obrigação do adquirente de arcar com essa verba, afastando-se a responsabilidade da incorporadora de restituí-la, na hipótese de resolução do contrato. A nova Lei incorporou esse entendimento, ao prever que essa verba não integrará o valor a ser restituído ao adquirente, na hipótese de resolução do contrato.
É senso comum que, durante a realização de obras, diversos fatores podem levar ao atraso na sua entrega. Com isso em mente, os Tribunais já tinham consolidado o entendimento de que o atraso na entrega do imóvel de até 180 dias não acarretaria a penalização da incorporadora. Assimilando esse posicionamento judicial, a nova Lei estabelece que, se prevista a hipótese no contrato, o atraso na entrega por esse mesmo prazo não dará causa à resolução por parte do adquirente, nem acarretará o pagamento de qualquer penalidade, pelo incorporador.
Por outro lado, se o atraso ultrapassar os 180 dias, o adquirente poderá promover a resolução do contrato, recebendo a integralidade dos valores pagos, além da multa estabelecida no contrato, para a hipótese de resolução. Caso o adquirente decida manter a contratação, não se aplicará multa, mas ele terá direito à indenização de 1% (um por cento) do valor efetivamente pago à incorporadora, para cada mês de atraso.
Quando a resolução do contrato se der por inadimplência do adquirente, também deverá haver a devolução dos valores pagos. Contudo, a multa será devida à incorporadora. Para tanto, a Lei fixou percentuais distintos para as incorporações imobiliárias submetidas ou não ao regime do patrimônio de afetação, sendo que pode chegar até 50% da quantia paga nesta última hipótese, mas não pode ultrapassar os 25% nos demais casos. Esse ponto específico ainda pode gerar questionamento por parte dos adquirentes, já que contraria a posição jurisprudencial predominante. Muito embora os Tribunais reconheçam a validade da multa, firmaram entendimento no sentido de que valores que superem os 25% não são razoáveis.
Havendo a resolução por inadimplência do adquirente após a entrega das chaves, a incorporadora também terá direito aos valores relativos ao IPTU e às taxas condominiais. Mais uma vez assimilando o posicionamento judicial já consolidado, a Lei ainda assegura, à incorporadora, um valor mensal de 0,5% do valor do contrato, correspondente à fruição do imóvel, pelo período em que a unidade autônoma esteve disponível ao adquirente.
Todas essas verbas poderão descontadas, pela incorporadora, do valor a ser restituído ao adquirente. Contudo, as quantias retidas não podem ultrapassar o que ele efetivamente pagou.
Além disso, se o adquirente encontrar comprador substituto, que seja aprovado pela incorporadora, não se aplicará a multa, ficando ressalvadas as quantias relativas à fruição do imóvel, que serão devidas mesmo nessas hipóteses.
A Lei também estabelece prazos para a restituição dos valores pagos pelo adquirente. Nos casos em que a incorporação estiver submetida ao regime do patrimônio de afetação, deve ocorrer em até 30 dias da expedição do “habite-se” ou documento equivalente. Nas demais hipóteses, a incorporadora deverá realizar o pagamento em uma única parcela, 180 dias após o desfazimento do contrato. Entretanto, caso a unidade seja revendida antes desses prazos, o valor remanescente deverá ser pago ao adquirente em até 30 dias da revenda. Também nos casos em que o imóvel for leiloado judicial ou extrajudicialmente os prazos serão distintos, observando-se “os critérios estabelecidos na respectiva lei especial ou com as normas aplicáveis à execução em geral”.
Tendo em vista o que dispõe o Código de Defesa do Consumidor, a Lei ressalva o direito ao arrependimento, pelo consumidor, sempre que a aquisição se der “em estandes de vendas e fora da sede do incorporador”. Nessas hipóteses, desde que o adquirente notifique a incorporadora no prazo de 7 dias, poderá resolver o contrato sem qualquer ônus. Assim, a restituição deverá ser integral, inclusive com a taxa de corretagem.
Para que todas essas previsões sejam válidas, contudo, a Lei impõe uma série de requisitos, que incluem a forma do contrato, a clareza na redação das cláusulas, o destaque àquelas que preveem as penalidades, a “anuência prévia e específica do adquirente”, dentre outras. Desse modo, as novas previsões legais só se aplicarão aos contratos a elas adaptados, de modo a preencherem todas as exigências. Essas adaptações irão gerar contratos mais seguros, com regras mais claras.
A nova Lei do Distrato Imobiliário, assim, representa um incentivo para o desenvolvimento do mercado imobiliário no Brasil, na medida em que leva mais equilíbrio às relações contratuais e estabelece, de forma clara e precisa, as regras para o distrato – o que pode reduzir o elevado número de discussões judiciais que tratam justamente das questões agora legalmente estabelecidas.
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