A responsabilidade dos sócios na prática somente acaba sendo limitada em raríssimos casos, tão pouco são eles, que estão mais para exceções do que para regras gerais.
Por Peregrino Dias Rosa Neto – Sócio Fundador
Antes denominadas Sociedades por Quotas de Responsabilidade Limitada, passaram a ter o nome abreviado para Sociedade Limitada com o Código Civil de 2002 que dotou este tipo jurídico de ampla regulamentação, o que faltava ao antigo Decreto Lei de 1919 que as disciplinava. Mas melhor andaria o legislador do novo Código se também retirasse da denominação a expressão “Limitada”, porquanto a responsabilidade dos sócios na prática somente acaba sendo limitada em raríssimos casos, tão pouco são eles, que estão mais para exceções do que para regras gerais.
A razão primeira da limitação de tal responsabilidade consiste na separação entre o patrimônio pessoal dos sócios do patrimônio da pessoa jurídica. Em principio esta separação deveria ser um incentivo ao empresário que poderia investir sem comprometer seu patrimônio pessoal. Assim, os sócios responderiam apenas pelo valor de suas quotas. Responderiam também subsidiariamente pelos valores eventualmente subscritos e não integralizados. Na prática esta subsidiariedade é inócua, pois não há como terceiros verificarem a efetividade da integralização. Contudo, em apertada síntese, pode-se apontar numerosos casos em que a responsabilidade dos sócios pelas obrigações da sociedade é ilimitada.
Em primeiro lugar estão os titulares de créditos tributários de que tratam o artigo 135, III do Código Tributário Nacional e dos previdenciários previstos no artigo 13 da Lei 8.620/93, nos quais a responsabilidade dos sócios administradores é ilimitada. Ainda ocorre a responsabilidade dos sócios por atos contrários a lei ou ao estatuto social, no caso atribuível ao sócio que o praticou; é o caso clássico de excesso de mandato, quando o sócio assume obrigações para as quais não tem poderes. Estes são os casos em que as exceções decorrem diretamente da própria Lei. Porém outros existem em que a limitação da responsabilidade dos sócios é subtraída pela figura da Desconsideração da Pessoa Jurídica, prevista em diversas leis especificas, através das quais a segregação do patrimônio dos sócios é desfeita, para o fim de alcançar seus bens pessoais. Assim é nas situações previstas no Código de Defesa do Consumidor, em que em numerosas situações o consumidor pode pedir a desconsideração da pessoa jurídica, e não apenas da empresa com a qual se relaciona, mas também com suas controladas, coligadas, consorciadas ou ainda qualquer outra que seja obstáculo a indenização.
Outra situação está na Lei 12.529/2011, que trata da Defesa da Concorrência e Infrações Contra Ordem Econômica, pela qual a personalidade jurídica do responsável por infração de ordem econômica poderá ser desconsiderada quando houver por parte deste abuso de direito, excesso de poder, violação de lei, fato ou ato ilícito, ou ainda violação dos estatutos ou contrato social. Também a Lei 9605/98, que coíbe as infrações lesivas ao meio ambiente, diz que poderá ser desconsiderada a personalidade jurídica sempre que sua personalidade for obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados a qualidade de meio ambiente. Tudo isto sem falar na responsabilização dos sócios em reclamatórias trabalhistas, em que a Justiça do Trabalho é useira e vezeira em ultrapassar a barreira da separação patrimonial, seja através da Desconsideração da Pessoa Jurídica, seja por utilizar-se do conceito de grupo econômico, de que trata o Art.2º. da CLT.
Como se não bastasse, afora todas estas situações em que a limitação da responsabilidade é inexistente, temos ainda aquelas em que justamente pelo fato do tipo jurídico da sociedade, credores desta envolvem o sócio através da coobrigação, via aval ou fiança. O fato é que com esta verdadeira constelação de casos de inexistência de limitação, acaba ocorrendo, mal comparando, uma promiscuidade entre os ativos da pessoa jurídica e o patrimônio dos sócios, de tal modo que a sociedade mais se equipara a antiga empresa individual do que o nome Limitada sugere. E aí está o ponto que se quer destacar: não são poucas as incongruências e até anacronismos que o Código Civil de 2002 trouxe em seu advento, mas pelo menos esta, de rotular estas sociedades de “Limitadas”, bem poderia ser consertada, para suprimir esta palavra, substituindo-a por qualquer outra que não desse esta falsa ideia sobre a responsabilidade de seus sócios. Ou pelo menos, que não se iludam os empresários que adotarem este tipo jurídico em suas sociedades.